Os rumores de que países europeus travariam o acordo Mercosul-UE por conta da crise ambiental brasileira já circulavam com força entre diplomatas e parlamentares do bloco em junho de 2020, como reportou o El País. No final de agosto, a chanceler alemã Angela Merkel afirmou ter “dúvidas consideráveis” sobre seu apoio ao acordo com o bloco sul americano em decorrência do aumento do desmatamento da Amazônia.
Em setembro, enquanto o recorde de queimadas e desmatamento no Brasil voltou a ameaçar o tratado. A pressão de empresários e fundos de investimento sobre o governo brasileiro também aumentou.
No dia 09, foi divulgada uma análise feita por um grupo internacional de pesquisadores das universidades de Oxford (Reino Unido), Louvain (Bélgica) e Columbia (EUA) afirmando que o texto do acordo Mercosul – UE não prevê mecanismos de transparência, sanção e inclusão de comunidades locais, o que desrespeita diretrizes de meio ambiente do bloco europeu. A análise indica que o acordo falha em garantir a sustentabilidade das cadeias produtivas. Na mesma semana a Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu divulgou uma moção pedindo mais exigências de proteção nos acordos comerciais do bloco, em outro sinal da dificuldade em ratificar o tratado.
Uma semana depois, no dia 15 de setembro, duas cartas de peso pressionaram o governo brasileiro. O vice-presidente Hamilton Mourão recebeu documento assinado por embaixadores de oito países europeus — Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Holanda, Noruega, Dinamarca e Bélgica — com uma mensagem direta: “O Brasil está tornando cada vez mais difícil para empresas e investidores atender a seus critérios ambientais, sociais e de governança”. A carta, que questiona a política ambiental do governo, foi enviada pelos países que participam da declaração de Amsterdã, uma parceria entre nações para promover sustentabilidade e cadeias produtivas que não provoquem a destruição florestal.
Em outra carta, uma coalizão formada por 230 organizações e empresas ligadas ao agronegócio e a àrea ambiental enviou um conjunto de seis propostas para deter o desmatamento da Amazônia. O documento foi encaminhado ao presidente Jair Bolsonaro, ao vice Hamilton Mourão, ministros, líderes da Câmara e do Senado, além de embaixadas e representantes do parlamento europeu. “Não somente pelo avanço das perdas socioambientais envolvidas, mas também pela ameaça que a destruição florestal na região impõe às questões econômicas nacionais. Há uma clara e crescente preocupação de diversos setores da sociedade nacional e internacional com o avanço do desmatamento”, diz o texto assinado pela Coalizão que reúne ONGs como WWF e empresas do agro como JBS, Marfrig, Basf e Bayer.
Enquanto isso, na França, mais de 30 organizações da sociedade civil publicaram carta aberta no dia 16 de setembro exigindo o “enterro definitivo” do acordo comercial Mercosul-UE devido ao “impacto desastroso” sobre florestas, clima e direitos humanos. O manifesto das ONGs foi divulgado na véspera da publicação de um relatório encomendado pelo governo francês sobre os impactos do tratado.
No dia 18, o relatório do governo francês foi divulgado. De acordo com reportagens sobre o estudo de 184 páginas elaborado por especialistas independentes em meio ambiente e economia, a conclusão é que “o acordo é uma oportunidade perdida pela UE de usar seu poder de negociação para obter garantias sólidas que respondam” às expectativas “ambientais, sanitárias e sociais de seus cidadãos”. O relatório calcula que o desmatamento nos países do Mercosul poderia se acelerar 5% ao ano devido ao aumento de demanda por carne bovina na UE, gerando aumento de emissões de gases de efeito estufa e questionando se os ganhos econômicos do acordo compensariam os custos climáticos. Logo após a divulgação do estudo, o governo do presidente Emmanuel Macron confirmou que mantém sua oposição, anunciada em 2019, ao tratado tal como está e que quer renegociar os termos com parceiros europeus e latino-americanos para garantir respeito ao Acordo de Paris sobre mudanças climáticas.
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